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A tortura como ferramenta durante o regime militar

Devido ao trabalho investigativo de projetos como Memórias da Ditadura e Comissão Nacional da Verdade, descobrimos que censurar, perseguir e punir eram rotina

13 de outubro de 2017, às 23:54 | Redação

Pau de arara, jacarés vivos e cadeira do dragão. Essas não são invenções de uma literatura mágica e leve, mas sim da história da violência do regime militar, no Brasil, entre 1964 e 1985. Os relatos dessas histórias vem daqueles que sobreviveram à repressão promovida ao longo de cinco mandatos presidenciais na ditadura, uma forma de política que age por meio da força e do autoritarismo. No entanto, as marcas deixadas pelas técnicas de tortura relatadas não sumiram com o passar do tempo.

Para lembrar o Dia Internacional de Apoio às Vítimas de Tortura, em 26 de junho, convidamos vocês a conhecer mais de perto a importância dessas memórias, que ainda são reproduzidas em algumas ações policiais pelo país. Devido ao trabalho investigativo de projetos como Memórias da Ditadura e Comissão Nacional da Verdade, descobrimos que censurar, perseguir e punir foram tarefas rotineiras de certas instituições do passado. Vamos entender juntos o que significou isso?

Perseguição aos militantes políticos

COMO UM DIA A TORTURA, OU TORTURAR ALGUÉM FOI PERMITIDO?

Pode parecer loucura, estado de exceção ou mesmo invenção: o fato é que a Declaração Universal dos Direitos Humanos surgiu apenas em 1948, no contexto da Segunda Guerra Mundial, quando o mundo já tinha presenciado longos períodos de escravidão e de violências contra minorias, por exemplo. Somente em 1985, com apoio da Organização das Nações Unidas (ONU), ocorreu a primeira Convenção Interamericana para Prevenir e Punir a Tortura, trazendo os seguintes pontos:

Com essas definições na ponta da língua, não seria possível dizer que regimes ditatoriais, ao autorizar práticas de tortura, ferem os direitos humanos universais? Afinal, diminuir a capacidade física ou mental dos cidadãos pode dificultar um ambiente coletivo de participação política e de liberdade de expressão – entre outros tópicos abordados na Declaração Universal dos Direitos Humanos de 1948.

A polêmica sobre o papel do governo nas vivências de tortura da população é tanta que “serão autores da prática de tortura os empregados ou funcionários públicos que participem diretamente ou por instigação da execução do crime (art. 3º)”, segundo a mesma Convenção. Por outro lado, o Brasil tem a sua própria perspectiva do Crime de Tortura, Lei n.º 9.455/97, que considera responsável qualquer pessoa ou instituição que promova a tortura, não só os funcionários como na ditadura.

E como a tortura foi usada no regime militar? Confira todas as instituições na linha do tempo!

A partir da compilação geral da Comissão Nacional da Verdade, foram encontrados 377 agentes que não respeitaram os direitos humanos, em nome da ditadura militar, incluindo atividades de tortura aos prisioneiros. É importante perceber que os departamentos não foram criados para essa finalidade no geral, visto que o DOPS foi utilizado no Estado Novo de Getúlio Vargas e a CENIMAR foi criada em 1957, para obter informações de interesse da Marinha. Durante o cenário político a partir de 1964, surgiram novas funções nessas áreas, como atuar na contrainformação, por exemplo, uma maneira de neutralizar o acesso dos movimentos contrários – o “inimigo” – às informações das instituições do regime militar.

Já em 1968, o Ato Institucional nº 5 (AI-5) aumentou a repressão institucional. Pouco tempo depois, em 1971, surgiram episódios famosos como o de Zuzu Angel, no Rio de Janeiro, que evidenciavam internacionalmente o cotidiano da violência. Seu filho, integrante do Movimento Revolucionário 8 de Outubro (MR-8), foi preso e faleceu devido aos ferimentos causados na tortura.

“Não se sabe dizer ao certo quantas pessoas foram torturadas por razões políticas durante a ditadura militar brasileira” — Comissão Nacional da Verdade.

No mesmo período, o chefe do DOI-CODI unia esses dois setores para mapear, encontrar e processar manifestações ou guerrilhas contrárias ao regime. No cargo, esteve Carlos Ustra, de 1970 a 1974. Um ano depois, o AI-5 foi revogado e deu-se início à fase de abertura política, de modo sutil e gradual, o que representou o retorno de alguns direitos civis e políticos à esfera social.

Leia mais: Conheça a Constituição de 1967, elaborada durante a ditadura.

Manifestações contra a ditadura

O QUE ACONTECEU COM OS TORTURADORES?

Em 1979, a Lei da Anistia absolveu aqueles que cometeram, segundo a lei, atos de terrorismo, assalto, sequestro e atentado pessoal. Por outro lado, foram perdoados também os agentes que atuaram nas instituições de segurança desde 1961. Enquanto o perdão fora concedido aos dois lados, a tortura tornava-se um crime hediondo apenas na Constituição de 1988, não sendo permitida a sua anistia desde então. Como a medida de 1979 é anterior, o Ministério da Defesa mantém a sua decisão.

CONCLUSÃO

A releitura dos acontecimentos começou apenas em 2012, com as análises sobre violações de direitos humanos no regime militar. Foram contabilizados 434 mortos e desaparecidos políticos, no mínimo, e seus relatos foram divulgados ao público. Ademais, a Comissão Nacional da Verdade menciona o legado da violência: ainda hoje, as ações policiais utilizam-se de força física e coerção psicológica.

Em períodos de manifestações nas ruas contra o governo, algumas características da ditadura retornam, como a convocação do exército por meio da Operação de Garantia de Lei e Ordem (GLO). Seja em eventos nacionais como as Olimpíadas 2016, seja na porta do Governo Federal em maio de 2017, o uso dos agentes de segurança para controle social ainda é uma dessas exceções comuns.

E você? O que vê de semelhança? Ou vê também diferenças? Compartilhe e relembre a importância do Dia Internacional de Apoio às Vítimas de Tortura, em 26 de junho.

Fontes: Exame; UOL Economia; Planalto; Memórias da Ditadura; Comissão Nacional da Verdade.

Conteúdo do portal Politize! escrito por Bruno Blume.


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