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Felipe Santolia: Agradecimento pelo meu começo e tristeza por você

O começo de um jovem que buscava espaço na imprensa piauiense e que contou com a generosidade de repórter como poucos

28 de junho de 2021, às 11:00 | Douglas Cordeiro

Conheci Felipe Santolia quando comecei a estagiar na televisão. Ele, vindo de São Paulo, já era repórter e destacava-se por ter um ótimo desempenho no vídeo, texto objetivo, linguagem fácil de entender e uma criatividade natural, que era percebida em cada reportagem, desde a mais simples até as produções mais elaboradas.

Assim como eu, ele também foi orientado pelo jornalista e diretor-executivo da emissora, Tony Trindade, um dos profissionais de TV mais talentosos com quem tive a oportunidade de trabalhar.

Na época, nenhum dos repórteres já conhecidos e com carreira consolidada, tinha muita paciência para ensinar um jovem que buscava iniciar no telejornalismo. Depois de muitas tentativas, procurei Tony Trindade e falei da dificuldade que estava enfrentando para receber orientações.

“Douglas, você vai acompanhar agora o Felipe Santolia”, disse o diretor-executivo.

Todos os dias, saíamos eu, Felipe e geralmente, Madone Valcacer (Cinegrafista) e Neto Chaves (Auxiliar de Externa). Eram manhãs de muitos risos e aprendizagem. Como ser humano, era imprudente, nunca pensava nas consequências do que fazia. Eu, bem mais novo e com pouca experiência de vida, era mais prudente, avaliava tudo e era precavido.

Tony, sempre teve um olho clínico e conseguia enxergar mais longe. Um certo dia, chamou-me em sua sala para uma tarefa.

“Douglas, como você sabe, o Felipe está viajando para o interior, produzindo reportagens e eu queria que você fosse com ele para começar a entender como são as reportagens especiais e ‘vigiar’ nosso amigo”, revelou Trindade.

Felipe Santolia, Douglas Cordeiro e o cinegrafista Madone Valcacer, esse era o trio que percorria os municípios piauienses. Mais uma vez, é importante frisar, aprendi muito. Era uma abordagem diferente, o Piauí é muito rico, cheio de histórias, lendas, cenário perfeito para um jornalista que busca fugir das matérias produzidas diariamente na capital.

Trabalhávamos o dia inteiro e a noite, eu e Mardone, cansados, só tínhamos forças para jantar e dormir. Como na maioria das vezes, as cidades estavam em festa, Santolia ou “Sofolia”, como chamávamos, virava a noite.

Um dia, fomos a minha cidade, Castelo do Piauí, durante o período eleitoral, o ano, já não lembro. O que me recordo, é da polêmica sobre uma urna, ainda não era voto eletrônico, que tinha sumido da vizinha cidade de Juazeiro do Piauí. Contei a história para o Felipe.

“Você sabe da história, conhece a cidade, então vai com o Mardone e faz a reportagem”, disse ele.

Fiquei assustado, afinal, até então, tinha feito apenas alguns testes e agora tinha recebido a tarefa de produzir uma matéria completa e sobre um tema polêmico. Bom, só para constar, enquanto eu fui tentar registrar os fatos, ele ficou em um bar, tomando uma cerveja gelada.

Voltamos, horas depois e ele pediu para vê todo o material e o texto que eu havia escrito. Fez algumas correções, explicou os motivos e depois mandou que eu concluísse a gravação. Foi a primeira matéria que fiz para televisão.

Continuamos amigos, mas a partir daquele momento, iniciei como repórter. Depois ele trocou de emissora, foi para a TV Meio Norte, saiu e em seguida, deu-se início a fase mais polêmica da sua vida até chegar neste domingo, com sua prisão em São Paulo, registrada pelo programa Fantástico, da Rede Globo.

O relato feito por mim, não tem o objetivo de amenizar os crimes atribuídos a ele, das condenações já existentes e de outras que, provavelmente, virão. Todos os erros cometidos, enquanto esteve no comando da prefeitura de Esperantina e fora dela, devem ser pagos de acordo com o entendimento da justiça. O objetivo, é registrar essa passagem importante da minha história e mostrar como alguém, com tanto talento, não só no jornalismo, mas em diversas outras atividades, pode jogar um futuro brilhante na lata do lixo.

Tem mais um fato que me lembrei agora. Entre as várias histórias contadas, ele disse que chegou a tentar a carreira religiosa. Não sei se é verdade mas ele sempre mencionava uma frase que traduz bem como ele chegou até aqui.

“Eu era o Frei Felipe e a gora sou o Felipe sem frei”, dizia sempre.

Felipe Santolia / FOTO: Meio Norte


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