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Então vamos recomeçar do começo?

A história se repete como farsa. Só que a farsa que vivemos agora é tão ou mais danosa quanto a tragédia do passado

11 de dezembro de 2017, às 00:49 | Edmar Oliveira

O velho barbudo já dizia que a espiral da história avança em círculos. Creio que no círculo em que estamos a espiral não avançou, mas retrocedeu para o lugar onde estava. Também dizia o velho que a história se repete como farsa. Só que a farsa que vivemos agora é tão ou mais danosa quanto a tragédia do passado.

Senão como acreditar que pessoas saídas da idade média fizessem uma manifestação contra a filósofa Judith Butter gritando “queimem a bruxa” e tascando fogo literalmente num boneco que representava o alvo na porta do Sesc Pompeia em São Paulo?

Já se fez análise em que se avalia a ascensão do conservadorismo como tática política da direita para a ocupação do poder e a destruição da democracia. O que me incomoda é de onde saíram tantos habitantes da idade média que viviam entre nós.

Defensores do criacionismo, da teoria da “terra plana” se impõem orgulhosamente contestando Darwin e Copérnico sem a menor cerimônia! Em nome de uma “Escola sem Partido” fica proibido o ensino de história e evolução científica nas escolas, descaracterizando o papel da educação por uma censura maluca. Inventou-se uma “ideologia de gênero” para descaracterizar um trabalho científico da década de 1960 em que psicólogos procuravam compreender a construção social e cultural do gênero em oposição à determinação sexual. Na apelação a uma idiota “cura gay” voltaremos à época em que juízes determinavam a castração química do “desviado”? A democracia é contestada porque nela os “esquerdistas” dominam o discurso e a defesa de uma anacrônica intervenção militar tenta ressuscitar a ditadura que nos custou vinte anos de trevas. A mobilização de amarelos contra a corrupção era apenas uma desculpa para tirar quem se achava vermelho (até muito pálido pra mim) do poder. Não há nenhum movimento contra uma corrupção descarada, instalada no poder atualmente.

“bruxa” da filósofa que foi queimada no protesto.

Até pouco tempo não era crível que existisse tantos habitantes da idade média entre nós. Alguns até apareciam, vez por outra, mas envergonhavam-se de sustentar suas teses anacrônicas. Parecia que elas existiam com crenças inconfessáveis.

Há algo ainda por decifrar, e os analistas de plantão ainda não me explicaram como eles saíram do armário de uma só vez e foram às ruas gritar as suas crenças como se fossem verdades celestiais que nós pecadores queremos negar. E multiplicaram-se geometricamente nos nossos ambientes de trabalho, nos apartamentos vizinhos, nas ruas, nos supermercados, nos cinemas, nas praças, nos bares. Em todos os lugares eles apareceram como se tivessem combinado o dia de explodir a intolerância guardada por tanto tempo.

Outro dia revendo jornais que fizemos na década de 1970, na Teresina de então, cidade conservadora e alinhada à ditadura da época, vi – estarrecido – entrelinhas do que era possível dizer com a censura vigilante dos anos de chumbo. Apenas duas frases:

“LADRÃO DESENVOLVIDO É LADRÃO SOLTO” – a outra:  “do jeito que a mentalidade desse povo anda, não tardará a sair nos jornais: CRIANÇAS NASCEM NUAS NA MATERNIDADE”.

Era apenas para driblar a censura e dizer que na ditadura tinha corruptos que não eram punidos e que a moralidade de então era ridícula.

Estávamos tal e qual em corrupção e conservadorismo como agora, né não?


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