O Uber é mais que um motivo de revolta dos taxistas
De maneira simplificada, o dispositivo tem sempre uma função estratégica concreta e se inscreve sempre em uma relação de poder
O que é o UBER?
Em sua tradução (do inglês ou alemão) é “acima”, algo “fashion”. Isso numa linguagem marxista exporia uma espécie de fetiche.
Mas o que realmente é o UBER?
Um ‘dispositivo’: valendo-me de um conceito do filósofo italiano Giorgio Agamben. De maneira simplificada, o dispositivo “tem sempre uma função estratégica concreta e se inscreve sempre em uma relação de poder”.
O exemplo clássico é o ‘tributo’, cuja inserção no conceito de dispositivo é auto-evidente. Aliás, tradicionalmente o mais poderoso dos dispositivos. Uma sobrecarga tributária excessiva e destrói-se a livre iniciativa, contraposto lógico de uma relação de poder que estabelece sempre uma relação hierárquica de obediência, portanto não livre e sem iniciativas.
O UBER, pelo fascínio/fetiche de um aplicativo de ‘smartphone’, é um ‘dispositivo’, demonstrando, na atualidade, algo ainda mais poderoso que o dinheiro: a tecnologia. Apresenta a ambiência de uma ‘Nova Era’ pós-fordista, de flexibilização das relações trabalhistas, aquilo que Marx chamaria ‘trabalho imaterial’ para uma fase do capitalismo tardio (Livro “Grundrisse”).
O UBER ‘enfraquece’ a máquina estatal, agravando sua ‘crise permanente’, como na ausência arrecadatória de licença municipal (o que no Rio de Janeiro e em São Paulo pode chegar a algo entre 150 a 180 mil reais). Mas não é só ruim para o Estado. Pergunte a um motorista de UBER quanto ganha! Há quem afirme que se trabalhar dez horas por dia de segunda a sábado tira, líquido, algo entre 2 a 3 mil reais. Não parece ser o emprego dos sonhos. Sim, e como ficaram os taxistas? Basta acompanhar o noticiário para ver que não estão muito satisfeitos pelas manifestações por um ‘mercado inteiro’ de transportes nas grandes cidades ter sido desnaturado/obsoletado. Mas é ruim para todos?
Não, para os consumidores é excelente. Fashion. É UBER!
Esse é o único motivo de sua aceitação. O consumidor, sobrecarregado em sua carga tributária, vê como um alívio. Essa flexibilização de relações de emprego, os taxistas do ‘Ancient Régimen’ vs. os uberistas da ‘New Age’, tem como consequências: (a) enfraquecimento arrecadatório do Estado; (b) uma sobrecarga laboral nos motoristas de UBER; (c) desemprego para a classe taxista.
É um novo poder, ‘dispositivo’, que se impõe sobre Estado, taxista e uberistas.
Espero que essas reflexões tenham agregado ao leitor e na próxima sexta-feira, falarei sobre “política de cotas”.
Raphael Greco Bandeira
Doutor em Constituição, Estado e Democracia (Unb)
Mestre em Filosofia Ética e Política (Unb)
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