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O Uber é mais que um motivo de revolta dos taxistas

De maneira simplificada, o dispositivo tem sempre uma função estratégica concreta e se inscreve sempre em uma relação de poder

29 de julho de 2017, às 17:34 | Raphael Bandeira

O que é o UBER?

Em sua tradução (do inglês ou alemão) é “acima”, algo “fashion”. Isso numa linguagem marxista exporia uma espécie de fetiche.

Mas o que realmente é o UBER?

Um ‘dispositivo’: valendo-me de um conceito do filósofo italiano Giorgio Agamben. De maneira simplificada, o dispositivo “tem sempre uma função estratégica concreta e se inscreve sempre em uma relação de poder”.

O exemplo clássico é o ‘tributo’, cuja inserção no conceito de dispositivo é auto-evidente. Aliás, tradicionalmente o mais poderoso dos dispositivos. Uma sobrecarga tributária excessiva e destrói-se a livre iniciativa, contraposto lógico de uma relação de poder que estabelece sempre uma relação hierárquica de obediência, portanto não livre e sem iniciativas.

O UBER, pelo fascínio/fetiche de um aplicativo de ‘smartphone’, é um ‘dispositivo’, demonstrando, na atualidade, algo ainda mais poderoso que o dinheiro: a tecnologia. Apresenta a ambiência de uma ‘Nova Era’ pós-fordista, de flexibilização das relações trabalhistas, aquilo que Marx chamaria ‘trabalho imaterial’ para uma fase do capitalismo tardio (Livro “Grundrisse”).

Aplicativo UBER

O UBER ‘enfraquece’ a máquina estatal, agravando sua ‘crise permanente’, como na ausência arrecadatória de licença municipal (o que no Rio de Janeiro e em São Paulo pode chegar a algo entre 150 a 180 mil reais). Mas não é só ruim para o Estado. Pergunte a um motorista de UBER quanto ganha! Há quem afirme que se trabalhar dez horas por dia de segunda a sábado tira, líquido, algo entre 2 a 3 mil reais. Não parece ser o emprego dos sonhos. Sim, e como ficaram os taxistas? Basta acompanhar o noticiário para ver que não estão muito satisfeitos pelas manifestações por um ‘mercado inteiro’ de transportes nas grandes cidades ter sido desnaturado/obsoletado. Mas é ruim para todos?

Não, para os consumidores é excelente. Fashion. É UBER!

Esse é o único motivo de sua aceitação. O consumidor, sobrecarregado em sua carga tributária, vê como um alívio. Essa flexibilização de relações de emprego, os taxistas do ‘Ancient Régimen’ vs. os uberistas da ‘New Age’, tem como consequências: (a) enfraquecimento arrecadatório do Estado; (b) uma sobrecarga laboral nos motoristas de UBER; (c) desemprego para a classe taxista.

É um novo poder, ‘dispositivo’, que se impõe sobre Estado, taxista e uberistas.

Espero que essas reflexões tenham agregado ao leitor e na próxima sexta-feira, falarei sobre “política de cotas”.

Raphael Greco Bandeira

Doutor em Constituição, Estado e Democracia (Unb)

Mestre em Filosofia Ética e Política (Unb)


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